A consciência é uma formação
performática de conjunturas de ideias interligadas pela consciência não
consciente de si, mas que faz a transmutação entre o real percebido e a
consciência que percebe para transformar a mesma num todo conjuntivo e coerente
de percepção/compreensão do mundo e da realidade que se apresenta no mundo num
dado momento. Assim, nesse processo ininterrupto de formação do eu, sempre
conjugado no tu e eles, formamos consciências que não se percebem como
consciência, consciências que não sabem saber dos encadeamentos formadores de
si mesmas. Consciências que são formadas sem consciência de sua formação e até
mesmo sem consciência de sua existência como consciência. É nesse plano que
alienados de si mesmos, os indivíduos ficam a mercê de consciências formadoras
de consciências, estas supostamente superiores ou detentoras do saber ou da
melhor vida, e entregam a outros a gênese de si mesmos. O que significa que dá
há outro que não o conhece, não o viu ou que nem sequer sabem de sua
existência, o direito e o poder de decidir para si como será seu próprio viver.
A todo esse bloco de formação do pensar e do existir Karl Marx vai intitular de
ideologia dominante e alienação do dominado.
Não poderíamos dar partida a
nossa reflexão por outra via. A consciência social formada segundo a condição
material daquele que a adquire, o inscreve em uma realidade dada que o
condiciona a ideologias norteadoras do seu agir e pensar, e que ao mesmo tempo lhe
rouba a consciência/capacidade de perceber que ela assim o faz. Em outros
termos, naturaliza sua condição existencial como sendo a única que poderia ser
e ao mesmo torna essa condição positiva acrescentando a ela outras ideologias
estruturadoras da sua própria existência, algo como galgar uma elevação social
ou uma utópica guinada material.
Ora, Marx está aqui propondo
que a sociedade capitalista é construtora de uma estrutura delimitante da
condição existencial de todos aqueles que não participam da construção das
condições sociais de convivência e que ao mesmo tempo os impede do desfrute
daquilo que é produzido nessa mesma sociedade, e que pasmem vocês, é
necessariamente produzido por aqueles que estão excluídos da construção social
de convivência. Assim, o que Marx quer propor não é a simples compreensão dessa
estrutura para análises sociológico-filosófica, como ele mesmo diz:
“Os filósofos até agora se preocuparam em
interpretar o mundo, mas o que importa é transformá-lo!”
A proposta é de uma práxis existencial,
consciência e ação como uma interação de existência construtora de realidades
niveladoras da condição de construção do pensar, agir e existir. Ao pensarmos
as categorias e estruturas do pensamento marxista e sua análise das estruturas
sociais que moldam e dominam/oprimem a cada um dos cidadãos. Poderíamos ir além
do autor e perceber que até mesmo o opressor é um oprimido, visto que sua
condição, geralmente alienada, o obriga a agir em consonância com sua própria
situação existencial. E aqui fechamos o cerco da proposta desta reflexão, “pois
a alienação é tanto mais eficaz quanto
maior a alienação daqueles que produzem e reproduzem a mesma”, ou diria
Marilena Chauí muito melhor do que eu: “O
que faz da ideologia uma força quase impossível de ser destruída é o fato de
que a dominação real é justamente aquilo que a ideologia tem por finalidade
ocultar”. E nosso papel nesse arcabouço ideológico é perceber que o mesmo
existe e a partir dessa percepção criar novas possibilidades reais e, sobretudo
conscientes de que são construções utópicas e que assim devem ser trabalhadas
em uma dialética com o real, para que no diálogo com o mesmo vá sendo
remodelada/reestruturada, feita para atender aos anseios e necessidades do
maior número possível. Parece que falamos aqui de uma ideologização as avessas.
Marx não gostaria dessa reflexão certamente. E já que a proposta é de subversão
marxista. Digo que: “Não podemos pensar em um modelo político ideal em oposição
ao vigente, precisamos compreender o vigente, e conscientes (“sem” alienação)
trabalhar para transformá-lo, buscando que o mesmo contribua para o melhor na e
da sociedade, sem com isso causar a derrocada do mesmo, o que seria muito pior.