quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

O Brasil não Presta

O Brasil Não Presta[1]: breve análise da não identificação como identificação nacional
É provável que a maior parte dos brasileiros já tenham dito: “O Brasil não Presta” ou alguma sentença similar. O fato é que vivemos em um Brasil que não vemos enquanto falamos de um Brasil que imaginamos que deveria ser como o idealizamos a partir de ideias ideais de nação. Tal ideia está presente no texto Escorraçando o Vira-latas[2]:
"Os brasileiros acham que o mundo todo presta, menos o Brasil, realmente parece que é um vício falar mal do Brasil. Todo lugar tem seus pontos positivos e negativos, mas no exterior eles maximizam os positivos, enquanto no Brasil se maximizam os negativos”.
Falamos de um Brasil que não é nosso, um Brasil que representamos em discursos e ideias, um Brasil que faz parte de nossa alienação social (representação de nossa realidade social sem auto reconhecimento na mesma), um Brasil que é nossa casa e nosso destino. Nos comentários do texto Escorraçando Vira-latas encontramos dezenas de comentários atacando o país (sua política, educação, povo, cultura) e dizeres como: “Quem pode suma deste lugar, faça o quanto antes” “vaza daqui, vão embora pra outro país”, “o pior do Brasil são os brasileiros”. São brasileiros falando de um Brasil que não aceitam, respeitam ou desejam. Como propor solução para uma nação/população que não se aceita sendo como é, e que, pior ainda, não se enxerga como responsável por seu país ser o que é. As soluções para tal problemáticas são problemáticas, visto que queremos usar o pé para cuidar/tratar do pé (usar as mãos seria mais eficiente). Vejamos alguns apontamentos da formação da psique brasileira segundo as observações de Contardo Calligaris em seu livro Hello, Brasil.
O Brasil em seu processo de formação não teve uma umtegração brasileira (a formação de um estado nacional), que seria o surgimento de uma nação com consciência de nação. Os diversos aspectos históricos contribuíram para isso, como a subjugação e genocídio dos índios, a integração forçada (e posterior rejeição social) dos negros africanos e a vinda de povos europeus e asiáticos em busca de conquistar no Brasil aquilo que não conseguiram em sua própria pátria. E estando aqui não construíram uma consciência e ideal nacional. Contardo aponta as diferenças existentes entre a independência americana e a independência brasileira, a primeira feita pela população local como representatividade de uma identificação existencial e nacional, e a segunda como um ato do colonizador/colono que tem por fundo seus próprios interesses (pessoais e familiares) e não os interesses de formação de um país, um Estado, uma nação, um povo, uma identidade e uma nacionalidade.
Então, o Brasil, presta ou não presta? O psicanalista Octavio Souza respondeu assim: “Este país não presta” talvez seja uma frase relacionada a um equívoco, como quando, ao tentarmos seduzir uma mulher que se mostra indiferente às nossas propostas, nós reagimos à desfeita protestando meio indignados, mas afetuosamente: “você não presta” (subtexto: “mas eu quero”[3]).
Para o colonizador o “Este país não presta” é sua frustração em não conseguir adquirir nele aquilo que perdeu em sua própria pátria, e o “Este país não presta” é para o colono o fracasso da umtegração, pois esse país não soube ser um pai, um um nacional capaz de assujeitá-lo (torná-lo sujeito). O “Este país não presta” é resultado de um olhar brasileiro alienado do que o Brasil é e do que imaginamos ou gostaríamos que ele fosse. Intuídos de um ideal nacionalista de diversas fontes externas ao Brasil, como se colocar o Brasil nas roupas dos Estados Unidos, Alemanha, França ou outro, pudesse dar-lhe mais dignidade.
Segundo o antropólogo Roberto DaMatta[4], é preciso fazer a distinção entre o brasil com letra minúscula que é o nome de um tipo de madeira de lei e de uma terra destinada a exploração, de Brasil com letra maiúscula, que designa um povo, uma nação, com conjunto de valores, escolhas e ideais de vida. E é precisamente isso que precisamos nos educar a ter como consciência, que existe um olhar, pensamento e ideia sobre o Brasil que não foi propriamente feita por brasileiros (ou pessoas que se sentissem brasileiras), mas esse olhar atravessou a história cultural de nossa formação e ainda povoa nossos pensamentos, levando-nos a pensar o Brasil como colonizador/colono ou como um estrangeiro com outras raízes culturais, os quais teriam razões culturais legitimas para assim pensar.
Tal qual Macunaíma, o herói sem caráter de Mario de Andrade, buscamos diariamente ser heróis da nossa própria existência tendo que subjugar a ética e o bom senso em nossa existência social. Ouvimos e aprendemos que o bom não é o certo, e que o certo é o que é bom, e que o bem pode as vezes se alinhar com os dois. E nessa ética aprendemos que o correto é se dar bem. Quem nunca passou vergonha ao afirmar que gostaria de fazer o certo mesmo que ao seu redor uma atitude incorreta fosse a adequada para todos. Apontamos o dedo para diversas esferas sociais e dizemos o que é certo e o que é o errado, e nesse julgamento valorativo excluímo-nos de valorar nossos próprios atos. Podemos falar daqueles que são ponto comum, os políticos, como representação de corrupção, os quais apontamos e condenamos, mas qual aluno aqui pode em sua consciência (de si para si) dizer que nunca colou, e que se fez foi por um motivo justificável. Assim, vivemos um complexo de Macunaíma, somos o herói que se vangloria não de seus atos éticos e heroicos, e, sim de sua auto elevação ao apontar as falhas e deslizes éticos dos outros.
É típico e originário do brasileiro falar mal do Brasil, pois praguejar sua nação é tão somente uma demonstração autêntica de brasilidade, de sangue tupiniquim nas veias, de assimilação e incorporação (psicológica, emocional, biológica e até fisiológica) cultural do Brasil em si. Quando se pragueja o Brasil se faz aquilo que é natural e cultural ao brasileiro. Se aprende desde cedo, em casa, na escola e em sociedade, a olhar o Brasil como o “país que não é” em vistas a exemplos de países que supostamente “são”. A complicação é que temos brasileiros falando de um Brasil que existe em suas cabeças a partir das idealizações que fazem em seus contatos ou conhecimentos de outros países/nações os quais supõem que o Brasil deveria ser igual. E opomos o Brasil que não existe com o Brasil que existe e fazemos o primeiro vencer o segundo, condenando o derrotado à execração e possível extermínio social de si no mesmo.
 “O Brasil não presta” entra na esfera intima/pessoal, cada um terá suas razões para dizer a favor da sentença ou contra a sentença. Se conseguirmos identificar as razões/motivações para o fazermos já teremos obtido um enorme progresso. Não pensaremos com pensamentos de outros (alienados), mas teremos nossas ideias, razões e motivações para amar ou rejeitar, elogiar ou criticar, aproximar ou afastar, se sentir brasileiro ou desejar o acréscimo de outra nacionalidade. Espero (de esperança) que fique explicito que o ato de questionar e discriminar a nação brasileira é uma característica natural da cultura nacional, e que, embora seja comum não precisa ser um destino comum de nossa própria formação intelectiva e existencial em nossa condição e consciência nacional ser um povo patriótico abortivo, que é rejeitar o útero que nos pariu ao rejeitar a pátria que nos pariu.



[1] As reflexões sobre o “um nacional” e a sentença “O Brasil não Presta” são expressões motriz do livro Hello, Brasil de Contardo Calligaris onde reflete a identidade do povo brasileiro forjada e decorrente de uma psique de colonizador e colono (uma tipificação ideal).
[2] O texto está disponível na internet em https://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/razoes-para-o-brasileiro-parar-de-falar-mal-do-brasil, porém, não consegui encontrar a autora.
[3] Hello, Brasil. Página 174. Editora Três Estrelas, 2017.
[4] O que faz do brasil, Brasil? Editora Rocco, 1986.

2 comentários:


  1. A esfera pessoal desestitui toda a ideia de patriotismo. Pq se eu amo, o faço com e apesar dos percalços. Contudo, se tiver um olhar egoísta, irei ponderar somente com aquilo que consigo extrair de bom. Serei mais um explorador, tanto quanto quem não é brasileiro faz... o Brasil pra mim é bom. Tenho casa, carro, trabalho. Mas olhando para o todo, não me sinto satisfeita, e sim, tento fazer "minha parte", mas a todo tempo há um questionamento martelando inquietantemente meu pensamento e me sinto tal qual Raul Seixas na canção Ouro de tolo.

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